A Intel anunciou, há pouco tempo, que um sistema de Inteligência Artificial (IA) havia conseguido prever com sucesso o resultado de 70% dos 7.700 processos decididos pelo Supremo Tribunal dos EUA entre 1953 e 2013.
Também, recentemente, a Google proclamou que uma funcionária de nome Emma Haruka Iwao, havia quebrado o recorde mundial de pi (símbolo matemático: π), através do recurso a 25 máquinas virtuais e 170 terabytes de dados para calcular pi para 31 trilhões de dígitos. Ao que parece um ser humano por si só teria levado 332.064 anos a executar tal cálculo.
Ou seja, alguns sistemas de IA excedem, hoje, a capacidade cerebral humana em geral, isto é, a superinteligência já emergiu. Somos redundantes?
Os sistemas de IA tornam-nos claramente mais produtivos, reflectindo uma tendência que monta à Primeira Revolução Industrial, que assentou na transição da produção artesanal para a produção por máquinas
A Segunda Revolução Industrial incluiu, entre outras coisas, um forte progresso no que toca a sistemas de transporte e de comunicação, através da introdução de navios de aço movidos a vapor, do desenvolvimento do avião e da invenção do telefone electromagnético.
A recente Terceira Revolução Industrial marcou o início da Era da Informação, tendo por base a passagem da tecnologia analógica para a tecnologia digital, que facilitou tarefas, permitiu a reprodução e a disseminação de informação em formato digital, democratizou o acesso à informação, à cultura e ao conhecimento e transformou o mundo numa aldeia global.
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A Quarta Revolução Industrial, a que hoje assistimos, engloba, entre outras coisas os referidos sistemas de IA, que são desenvolvidos com base no estudo da inteligência humana.
Tais sistemas optimizam os processos produtivos, uma tendência que, como vimos, está em marcha há centenas de anos. Isso é pacífico e não se quer invocar uma vaga de resistência ludita ao desenvolvimento tecnológico.
A questão crucial é se tal tecnologia substitui (ou está prestes a substituir) o labor humano ou se funciona em paralelo com o homem, facilitando as suas tarefas.
Por ora, no campo da propriedade intelectual, as máquinas ainda precisam do homem para inventar novas máquinas e processos. Não o fazem sozinhas.
É certo que os sistemas de IA prestam «auxílio» no âmbito do processo de inovação, mas por enquanto há sempre um ser humano por trás do design dos algoritmos, da selecção de dados e da análise dos resultados de tais algoritmos.
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Os sistemas de IA são correntemente utilizados para facilitar o processo de inovação, mas estamos ainda longe de dispensar a intervenção humana.
A IA agiliza o processo executado pelo inventor (humano) mas não o substitui, isto é, à data de hoje, os sistemas de IA traduzem-se numa ferramenta matemática muito útil, que exige, todavia, intervenção humana.
Esta conclusão é ilustrada pelo facto de que o tal recorde relativo à pi é atribuído a Emma Haruka Iwao e não à IA que a assistiu. A tecnologia por ela utilizada permitiu a notável quebra do referido recorde mas esse objectivo não teria sido alcançado sem intervenção humana.
A Quarta Revolução Industrial está claramente em marcha e a IA continuará a desempenhar um papel fundamental no que toca à escala e à velocidade dessa revolução. Exemplos de IA em tecnologias emergentes, que se configuravam
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como ficção científica há menos de uma década, são hoje parte do quotidiano de alguns: não mito, mas realidade.
Mas, por enquanto, o cenário existente em termos de produção intelectual não é homem versus máquina mas sim homem & máquina, repleto de equipas que abrangem seres humanos e sistemas de IA, fazendo lembrar a batalha entre Garry Kasparov (campeão mundial de xadrez entre 1985 e 2000) e a máquina e a solução encontrada pelo grande mestre de xadrez.
Em 1985, Kasparov venceu 32 máquinas em simultâneo, mas em 1997, para sua grande surpresa, a máquina (Deep Blue, um supercomputador criado pela IBM para o efeito) venceu o campeão mundial de xadrez. Garry Kasparov, indignado, afirmou que a IBM o havia enganado, mas não deixou de jogar e começou a treinar com um computador.
A máquina chegou para ficar, subsistindo, actualmente, em sede de produção intelectual, num quadro homem & máquina e não homem versus máquina.
E perante níveis crescentes de produção intelectual parcialmente gerada pela máquina e parcialmente gerada pelo homem, o grande desafio reside, para os formuladores de políticas públicas, no estabelecimento de regras sobre o nível de envolvimento humano necessário para a subsistência e atribuição ao homem de direitos sobre essa produção intelectual.
Patricia Akester é fundadora do Gabinete de Propriedade Intelectual.
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