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Bebés Proveta, Bebés Design: Do imaginário distópico de Aldous Huxley para a realidade

Fonte: Pixabay

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Em 1932, Aldous Huxley avançou, no inesquecível Admirável Mundo Novo, a noção de fabrico de seres humanos em série. A realidade distópica que descreve assenta numa linha de produção em que a configuração genética dos embriões é de tal forma precisa que não controla apenas factores estéticos (como a cor dos olhos e a altura) mas também a capacidade física e intelectual do indivíduo, levando à sua inserção em certa classe ou casta (Alfa, Beta, Gama, Delta e Épsilon) assim garantindo uma estratificação social rígida, inclemente e marcada. Por exemplo, os embriões Alfa são os líderes do Estado Mundial enquanto os Epsílones executam trabalho manual.

Da ficção para a realidade: Bebés proveta

Em 1978, nasceu no Reino Unido, Louise Brown, o primeiro bebé proveta. Uma nova era da Medicina emergiu sob a liderança de Robert Edwards, pioneiro da biologia e medicina reprodutiva, que permitiu a concretização do sonho dos pais de Louise.

A fertilização in vitro (que permite a fertilização exterior das células do óvulo com posterior transferência dos embriões para o canal uterino) passou, então, de visão a realidade.

Milhões de bebés in vitro depois, em 2010, o Pai da fertilização in vitro foi laureado com o Prémio Nobel de Fisiologia ou Medicina, tendo lembrado a prestigiada Academia Sueca que “a sua descoberta permitiu tratar a infertilidade, uma condição médica que afecta uma larga proporção da humanidade, incluindo mais de dez por cento dos casais de todo o mundo”.

O Vaticano criticou abertamente a decisão da Academia Sueca, tendo o Presidente da Pontifícia Academia para a Vida, Ignacio Carrasco de Paula, notado que embora o Vaticano tivesse dado o seu aval à fertilização assistida em 2008, considerava imoral a fertilização in vitro devido ao elevado sacrifício de embriões que lhe era inerente.

Da ficção para a realidade: Edição de genes

Em 2012, uma equipa liderada por Jennifer Doudna e Emmanuelle Charpentier, desenvolveu um método de edição do genoma, o CRISPR/Cas9, (“Clusters of Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats”) que facilita a edição de letras do ADN, método esse criado com base na constatação de que uma certa proteína, a proteína Cas9, actuava qual tesoura, desactivando, corrigindo ou substituindo genes com precisão.

O entusiasmo foi grande, uma vez que a técnica em causa emergiu com a promessa da prevenção de doenças hereditárias como distrofia muscular, hemofilia e fibrose cística, de tal forma que o Prémio Nobel da Química de 2020 foi atribuído a Doudna e a Charpentier.

Da ficção para a realidade: Bebés Design

A preocupação de muitos advém do facto de que o sistema CRISPR permite, ainda, o chamado melhoramento humano, levantando múltiplas questões éticas. O melhoramento humano já não é tema de distopias distantes.

Em 2018, a MIT Technology Review revelou que uma equipa liderada por He Jiankui havia recorrido à técnica CRISPR para editar em laboratório, in vitro, o genoma de dois embriões cujo pai era portador de HIV. Nesse ano nasceram os primeiros bebés geneticamente editados: as gémeas Lulu e Nana.

He Jiankui terá apenas desactivado o gene que permite a infecção relevante (HIV) mas segundo a mesma MIT Technology Review o cérebro das gémeas poderá ter sofrido alteração, com consequências em sede de memória e de cognição. A questão é se He Jiankui já antevia e pretendia tal efeito colateral.

Encontrar-se-á aberta a porta do melhoramento humano por meio da engenharia genética, do aperfeiçoamento de embriões, de modo a garantir que são bem nascidos?

Lembremos, aqui, que o termo eugenia criado em 1883 por Francis Galton significa, precisamente, bem nascido. Galton definiu eugenia como o estudo dos agentes que podem melhorar ou empobrecer as qualidades raciais, físicas ou mentais, de gerações futuras.

Ou seja, paira sobre a engenharia genética a suspeita de práticas eugénicas, sendo que a possibilidade de direccionar a engenharia genética para o melhoramento humano obriga à reflexão sobre questões éticas fundamentais e ao estabelecimento de normas globais.

Continua

Patricia Akester é fundadora do Gabinete de Propriedade Intelectual.

Nota: A autora não escreve de acordo com o novo acordo ortográfico.