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“Não podemos dar acesso aos bons sem dar aos maus”. Facebook escolhe a privacidade

Jay Sullivan, Product Director, Facebook, na Web Summit 2019 Crédito: David Fitzgerald/Web Summit via Sportsfile

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Líder do Messenger do Facebook garante a área de mensagens será 100% encriptada e sem backdoors em dois anos: “não podemos dar acesso aos bons da fita sem dar aos maus”. O que se ganha em privacidade, pode-se perder em segurança, mas empresa está a tentar alternativas.

Jay Sullivan é diretor de produto do Messenger, do Facebook, há cerca de um ano. Depois de uma vasta experiência no Firefox, do Mozilla, onde aprendeu “muito sobre privacidade e colaboração com comunidades para chegar a bom porto”, chegou ao Facebook para ajudar “a impulsionar a prioridade na privacidade” que a empresa de Mark Zuckerberg agora quer implementar. Essa opção, que ainda não tem vídeo ou áudio disponível, vai trazer alterações técnicas profundas, “uma nova geração” para as mensagens no Facebook, já que se vai usar a encriptação, à semelhança do que já acontece desde 2016 no WhatsApp.

E o que é que a encriptação significa? “Apostamos numa encriptação forte e sem backdoors, que era algo que alguns governos queriam, dessa forma nem o Facebook, nem hackers, nem autoridades vão ter acesso às mensagens de cada um”.

A mudança de posição foi anunciada em março, por Mark Zuckerberg, desde então começaram a haver testes no caminho da tal encriptação que vai, no fim de contas, permitir ligar todos os serviços de mensagens das empresas que pertencem ao Facebook: Messenger, Instagram e WhatsApp.

Zuckerberg traçou o caminho da encriptação no início do ano e voltou a repetir na conferência F8

 

Governos de vários países pedem ao Facebook a suspensão de encriptação de mensagens

Reino Unido, EUA e Austrália contra

Jay Sullivan explicou-nos numa mesa redonda onde participámos, pouco depois de ter estado num dos palcos da Web Summit, que desde o início do ano existe uma equipa dentro do Messenger só a tratar da privacidade e encriptação, cujos resultados depois são partilhados com a equipa global do Facebook. 

Numa altura em que o Facebook já tem 35 mil pessoas (a maioria subcontratada) a tratar de moderação de conteúdos nas suas plataformas, este tipo de iniciativas também pode tirar alguma pressão sobre essa área da empresa, a crescer a um ritmo vertiginoso, embora Sullivan não o tenha admitido diretamente.

O Facebook optou por fazer esta transição para a encriptação, que é apontada como “uma nova geração para o ecossistema da empresa”, de forma mais suave do que aconteceu com o WhatsApp. 

Por um lado, “há um trabalho técnico que demora”, por outro, agora querem fazer “um caminho mais lento, ouvindo várias partes”, até porque o Messenger era uma plataforma aberta e há inclusive apelos oficiais de governos e autoridades policiais de vários países contra a encriptação. 

“Quisemos ser totalmente transparentes sobre as nossas intenções e ouvir as várias partes, ao contrário do que aconteceu no passado”.  O Facebook tem tido “boa relação com as autoridades e governos, fornecendo informação quando são cumpridos os requisitos legais” ou então é a própria rede social a fazer denúncias quando casos mais graves acontecem na rede social.

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Sullivan admite mesmo que vivemos numa era de clara dicotomia entre as vantagens e desvantagens de um foco maior na privacidade (e na encriptação sem formas de entrada – backdoors), que vários governos como o britânico, norte-americano e australiano não querem e, depois, o caminho da segurança onde tudo o que é dito pode ser visto e observado. No entanto, essa observação pode ser feita não só por autoridades, mas também por outros agentes – de empresas de dados ou hackers.

Jay Sullivan garante que o Facebook não volta atrás, o caminho da empresa é mesmo o da encriptação “para garantir privacidade nos espaços privados”, até porque explica: “não podemos dar acesso aos bons da fita sem dar acesso aos maus.” Uma das vantagens para a empresa é que o conteúdo colocado nas mensagens deixa de ser uma responsabilidade da empresa, até porque não terá formas de conseguir ler as mensagens dos utilizadores (seja em texto, vídeo ou áudio). 

“Não, não usamos as mensagens do Messenger para publicidade”

Um dos esclarecimentos feitos na mesa redonda onde estivemos foi dado de forma categórica. Ao contrário do que muitos pensavam, Sullivan garantiu que o Messenger não está dentro da estratégia comercial do Facebook de uso dos dados pessoais de cada um para direcionar a publicidade de forma personalizada. 

“Não, não usamos as mensagens do Messenger para publicidade”. Quer isto dizer que o algoritmo não são analisa as mensagens privadas para direcionar publicidade consoante o que é dito.

Este mês o Messenger do Facebook estreou um novo hub de privacidade e segurança, em messenger.com/privacy. O objetivo? “Neste clima atual criámos um só sítio onde explicamos o que fazemos e não fazemos com os dados e algumas ferramentas para facilitar o seu controlo, para dar algum conforto às pessoas”. O slogan é “as suas mensagens são as suas mensagens”.

Jay Sullivan diz mesmo que, neste momento, “não há um modelo de negócio para o Messenger”, o foco é mais “resolver o caminho e as escolhas tomadas pela encriptação”, até porque o responsável admite que a escala de trabalhar no Facebook é tão grande que “é fácil tornar os produtos sólidos num sucesso”.

Autenticações de dois passos, alertas de login em navegadores ou de países diferentes ou navegação mais segura com alertas para links suspeitos são algumas das tentativas do Messenger para melhorar o serviço, onde também tentam reduzir spam e contas falsas.

“Temos a experiência, a equipa e a paixão para fazer um bom trabalho e ser o mais seguro possível nos limites de um serviço encriptado”, adianta o experiente gestor e engenheiro especialista em matemática aplicada.

Como já explicámos no artigo sobre as mensagens secretas já estarem disponíveis no Messenger, o serviço que já tem mais de mil milhão de utilizadores ativos terá nos próximos meses uma nova geração estrutural, chamada Light Speed, que será a base para a encriptação completa e tratá “fiabilidade, mais rapidez na app e um tamanho em megabytes bem mais reduzido [irá passar dos 130 mb para os 30 mb]”. Segue-se, depois, a interoperabilidade, ou seja, a capacidade de enviar ou receber mensagens entre os serviços que pertencem ao Facebook: Messenger, WhatsApp e Instagram.

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Privacidade prejudica segurança? Facebook faz testes

O diretor de produto do Messenger explicou que entrou no Facebook com a missão de trazer maior privacidade ao ecossistema: “é uma das prioridades da minha carreira, como já tinha acontecido com o Firefox”. Sullivan acredita que existem formas criativas de manter alguma segurança, mesmo encriptando todo o serviço de mensagens, algo que vai chegar também ao Instagram. Como? apostando cada vez mais nas denúncias dos próprios utilizadores para tentar limitar discurso de ódio, fake news e abusos contra menores no Messenger, mesmo sem ter acesso ao conteúdo das mensagens. 

Essa, de resto, tem sido uma das críticas feitas por reguladores e governos, que olham para a encriptação como um porto de abrigo para pedófilos ou outros criminosos, já que deixam de poder ser monitorizados a nível das mensagens que trocam.

Sullivan diz mesmo que têm tido bom feedback de ex-agentes do FBI ou da CIA, indicando que “o bem maior para a segurança em geral será proteger a privacidade, porque sem encriptação os criminosos podem poderiam invadir a privacidade das pessoas e isso também é perigoso”. 

O responsável admite que o tema é importante para o Facebook, mas pode haver outras formas de manter alguma segurança sem abandonar o caminho da encriptação. Uma delas é melhorar e aumentar a denúncia dos próprios utilizadores. “Se alguém denunciar uma mensagem que lhe enviaram, seja por que motivo for, nós dessa forma já podemos ver o conteúdo (porque alguém o enviou para nós) e agir em conformidade”, diz.

O interface para denunciar mudou nos últimos meses, para se tornar mais visível e simples, “e isso mudou radicalmente o número de denúncias na plataforma”. Além de se poder silenciar ou bloquear alguém, “é preciso não só favorecer as denúncias como tirar o medo às pessoas para que o façam sem problemas”. “Muitos ficam na dúvida se a pessoa que denunciamos irá ficar a saber, especialmente os jovens, mas há um trabalho que podemos fazer para reduzir esse receio”, explica, referindo-se também a predadores de crianças.

O objetivo em ser mais transparente é tentar antecipar os problemas, daí que o mês passado o Facebook juntou na Universidade de Stanford, na Califórnia, instituições de proteção das crianças, FBI, jornalistas e outras autoridades para discutir o tema na mesma sala. Em breve querem fazer o mesmo na Europa, naquela “que deve ser uma conversa global”. “Falar deste desafio holístico da sociedade é importante”, no entanto, o caminho está escolhido “e as conversas secretas estão no cerne da era digital atual”.

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