A Gestão dos Direitos dos Artistas (GDA), entidade que representa músicos, intérpretes e executantes, diz que há um desequilíbrio de mercado provocado pelas plataformas de streaming, cenário que pode ser atenuado com a nova diretiva europeia dos direitos de autor.
O polémico Artigo 13 tem dominado muita da atenção mediática relativamente à nova legislação dos direitos de autor que está a ser discutida a nível europeu. Mas para Pedro Wallenstein, presidente da GDA, há outros artigos na proposta legislativa que merecem igual atenção e que espera que venham a ser aprovados. Tudo para que os artistas portugueses tenham rendimentos mais justos.
Os artigos 14, 15 e 16 da proposta legislativa – que pode ser aprovada ainda durante o mês de janeiro – têm como objetivo dar aos artistas novas armas de negociação num mercado que é cada vez mais digital.
O Artigo 14 prevê que as plataformas de conteúdos sejam obrigadas a ter uma maior transparência, informando os artistas sobre como as suas obras estão a ser exploradas, quais as receitas geradas e a remuneração a que têm direito. O Artigo 15 prevê que os artistas tenham mecanismos adicionais que lhes permitam renegociar os seus contratos com as plataformas, sobretudo quando a remuneração inicialmente acordada seja muito inferior às receitas que se vierem a concretizar. Já o artigo 16 quer garantir novos sistemas de resolução de litígios caso os dois artigos anteriores não sejam cumpridos.
“Estamos a falar da necessidade dos artistas, no fundo, auditarem com mais rigor as contas das plataformas, porque eles por um lado dizem que a tecnologia permite-nos saber tudo ao segundo, mas depois quando questionámos dizem que ‘o modelo de negócio não está construído assim‘. Há opacidade [no mercado] e uma necessidade de transparência que está prevista nesses artigos”, começa por explicar Pedro Wallenstein.
O líder da GDA é o primeiro a reconhecer a importância que as plataformas de streaming de música – como o Spotify, Deezer, Apple Music, Google Music, entre outras – tiveram para os artistas e para o mercado.
“Foram muito importantes. Ouça, foi importantíssimo. A pirataria desenfreada que existia aqui há seis, sete anos, na década anterior, agora é praticamente residual. Porquê? Porque [os serviços de streaming] conseguiram legalizar a utilização desses conteúdos a preços muito baixos. Deixou de ser atrativo para o internauta estar a cometer uma ilegalidade quando até tem, gratuitamente – e isso é outro problema -, através dos mecanismos de publicidade. Na versão gratuita tenho anúncios entre as músicas. Para que é que vou ser pirata se posso aceder grátis?”, questiona.
Apesar deste lado positivo, Pedro Wallenstein considera que as plataformas de streaming de música tiveram efeitos negativos no mercado. Ou aquilo que o líder da GDA apelida de “faroeste instalado no mundo digital” e que “não é justo e proporcional para os criadores”.
“O rendimento também foi desenflacionadíssimo”, sublinha. “O que gera um stream é microcêntimos. E só funciona para quem tem grandes repertórios, como são as grandes editoras multinacionais, em que esses microcêntimos se avolumam e criam um rendimento muito razoável”, explica.
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Segundo a publicação Digital Music News, para um artista ganhar o equivalente a 87 euros, então as suas músicas teriam de ser tocadas quase 700 mil vezes no Spotify na versão gratuita – o valor baixaria para 150 mil vezes caso fossem ouvidas por utilizadores que pagam a subscrição do serviço de música.
O Spotify, a maior plataforma de streaming de música, tem mais de 87 milhões de subscritores e mais de 100 milhões que apenas usam a versão gratuita. O Apple Music, o segundo serviço mais popular, tem 57 milhões de subscritores e não disponibiliza uma versão gratuita.
“A lógica de como esse negócio [streaming de música] foi construído, foi numa lógica de quantidade. As grandes e médias editoras discográficas o que é que fazem? Disponibilizam por atacado o seu repertório, milhões e milhões de faixas musicais, recebem uma quantia por isso e depois distribuem de acordo com os contratos de edição que têm com os artistas. O que deixa logo de fora uma categoria importantíssima que é a dos executantes: todos os músicos que tocam nos discos, mas que não têm contrato direto com as editoras estão fora deste negócio”, detalha o presidente da GDA.
É por isso que diz que “o Spotify não está particularmente preocupado com a música portuguesa”, pois “é um negócio que funciona sendo global, só funciona havendo milhões e milhões de faixas disponíveis”.
Além do poder económico das plataformas digitais, Pedro Wallenstein diz que também têm “um poder de informação sobre os consumidores enorme, têm um poder de influência sobre os estados e os governos e as legislações”. “Também parte desta luta tem a ver com esta necessidade de temperar e equilibrar esta realidade”.
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