As máquinas vão mesmo ficar com os nossos trabalhos ou vão tornar-nos mais felizes?

Automação
Foto: REUTERS/Gleb Garanich

Quando se fala em automação, de robôs ou software, há uma reação de medo quase primal. Mas se nos fizer mais felizes, já aceitamos esta mão amiga?

Metade das tarefas que as pessoas desempenham nos seus trabalhos podem ser automatizadas. O número é da consultora McKinsey e tem tanto de espetacular, como de aterrador. Espetacular no sentido em que há de facto espaço para uma grande revolução tecnológica nas empresas feitas à boleia da automação. Aterrador no sentido em que parte desta automação pode resultar em vagas significativas de despedimentos.

Mike Hobday está do lado dos otimistas – nem podia ser de outra forma, já que a sua tarefa é justamente ajudar as empresas a aplicarem mecanismos de automação. O vice-presidente da IBM para esta área deu um exemplo concreto de um cliente no qual a automação já começou a ser implementada.

“Cinco senhoras recebiam perto de 60 emails todas as manhãs. Iam até à caixa de entrada, transferiam os ficheiros para uma pasta e iam abrindo cada um desses emails, descarregavam um PDF de 200 páginas do qual extraíam três pedaços de informação e depois colocavam isso no sistema. (…) Conseguimos automatizar isso em quatro dias e meio”.

O que é que isto significa? Para Mike Hobday significa o fim das segundas-feiras aborrecidas e do trabalho repetitivo.

“As pessoas não brilham quando estão a fazer tarefas repetitivas, a tirar informações de folhas de cálculo, colocá-las no sistema de forma repetitiva, todos os dias. Há organizações que têm centenas de pessoas que olham para imagens e extraem informação de PDF e que colocam-na no sistema. Isso não é uma vida”, defendeu o especialista em automação.

Se está a perguntar o que aconteceu às cinco senhoras e a todos os outros cujos trabalhos vão passar a ter um cunho de automação, esta é a resposta do vice-presidente da IBM. “Vai haver muitas novas oportunidades para eles se focarem em coisas que geram crescimento na empresa para a qual trabalham”.

Além de maior rapidez na execução de algumas tarefas, automação também significa menores taxas de erro na execução dessas tarefas. Naquilo em que as máquinas e os software são bons, não vai fazer sentido haver uma concorrência ‘direta’ por parte dos humanos.

“É um ambiente dinâmico, a automação está a chegar, não podemos pará-la, vai acontecer, temos de fazê-lo de forma responsável e penso que as grandes organizações estão a explorar e a investir na automação robótica de processos”, explicou.

Comparado com o aí vem, vivemos no Mundo Jurássico

Mike Hobday tem uma expressão curiosa para explicar aquilo que faz. “O meu trabalho é fazer os dinossauros correrem mais depressa”. “Se conseguir pegar num brontossauro de uma organização e conseguir transformá-lo num velociraptor, vai ter a oportunidade de comer a concorrência e investir em tecnologias disruptivas”.

O responsável da IBM deu o exemplo do Japão como um país que vai ter na automação uma resposta para um dos seus piores problemas. “No Japão tens a população a envelhecer – penso que 30% das pessoas têm mais de 60 anos. Eles têm uma escolha: imigração massiva de jovens para gerir as suas indústrias ou então automação”.

Não é à toa que o Japão é um dos países que há mais anos tem apostado na componente de robótica, ainda que automação não seja só sinónimo de máquinas a limparem a casa por nós ou a carregarem caixas nos armazéns das empresas. Automação também é software, como a automação robótica de processos, mais conhecida por RPA – são programas como este que libertaram as cinco senhoras dos emails para outras tarefas administrativas.

“Vai haver novos trabalhos. Não vejo a automação, e isto é genuíno, a ser usada para eliminar postos de trabalho. Estamos a trabalhar com um grande banco e estão a usar a automação para diminuir os riscos operacionais. Se automatizar, estou a simplificar, fico com menores taxas de erro e tenho maiores níveis de conformidade. Isso ajuda a evitar multas, aumenta a produtividade e as pessoas ficam contentes com o seu trabalho”, sublinha o porta-voz da IBM, para acrescentar logo de seguida:

“Não vou dizer que não vão existir problemas sociais, acho devíamos falar deles”.

Foi o que fizeram recentemente a Uber, Waymo e Daimler, por exemplo – juntaram-se para perceber o impacto dos carros autónomos na sociedade. Segundo um estudo da Goldman Sachs, de 2017, os picos de saturação dos veículos autónomos podem resultar em 25 mil novos desempregados todos os meses e em 300 mil por ano, só nos EUA.

“A automação está a chegar e precisamos de planeá-la. Se não planeares, vai haver consequências sociais”, atirou Mike Hobday. “As pessoas focam-se tanto nos robôs, nos sustos, mas a realidade é que há uma sinergia entre aquilo que as pessoas querem do trabalho e aquilo que a automação vai entregar”.

Claro que ficar de braços cruzados e ver o mundo a mudar a grande ritmo à nossa volta não ajuda. As pessoas mais bem sucedidas serão aquelas que “estão dispostas a aprender e a serem flexíveis” e também aquelas que estiverem em empresas com uma postura de evolução perante esta nova realidade.

“Acho que o trabalho deve ser um local onde cresces, desenvolves e aprendes. Penso que este novo ambiente [de automação] vai permitir isso – se as organizações se prepararem devidamente e se preocuparem com os funcionários”.